sábado, 3 de março de 2012

Casas vizinhas


Tenho um particular gosto em espreitar as casas dos meus vizinhos de prédio e acredito que o motivo transcende a mera curiosidade: fascina-me a forma como ocupam, de forma tão diferente da minha, a possibilidade do espaço e sua tipologia. Gosto de ver o que fizeram à arquitectura transparente, o modo como preencheram o vazio exterior do espaço. Quando apanho uma porta semi-aberta, lanço um olhar de soslaio à medida que subo ou desço as escadas. Vejo pouco, mas o suficiente para alimentar uma imaginação mais concreta. E depois, há aquelas casas onde já entrei ou estive várias vezes. Para um dos vizinhos, não foi evidente o meu quarto ser o seu quarto; noutro andar, a minha sala forrada a estantes é o quarto de uma criança que gosta de pintar as paredes; noutro ainda, a sala mudou de verbo e passou de “estar” a “jantar”. Sempre que estou numa casa vizinha, é como se alguém tivesse entrado em minha casa durante a minha ausência e transformado tudo, apagando à pressa todos os vestígios da minha presença. Como se um ser estranho morasse na minha casa. É aí que percebo que também habitamos imagens.